sábado, 15 de março de 2008

TINHA UM CANGAMBÁ, UMA PEDRA E UM CACTO REPELENTE NO MEIO DO MEU CAMINHO


Ilustração INISTA de Neli Maria Vieira

(Para José Alcides Pinto)


Quando levantei-me da cama,
numa manhã de novembro de l937,
molhado pela gosma fétida da placenta,
vi logo um cangambá no meio do meu caminho.

Esse bicho nojento
secou o leite de minha mãe,
comeu a minha papa rala,
tomou a minha sopa insossa,
cercou o meu caminho.

No início tinha uma enorme pedra
e um cangambá no meu caminho.
Drummond, um iniciante,
que já era uma sombra imensa,
quis roubar o meu primeiro verso.

Queria passar. Mas como?...
Se no meio do meu caminho
tinha uma pedra e esse cangambá nojento
sempre a me olhar?...

“Tinha uma pedra”
“tinha uma pedra”
“tinha uma pedra”
“tinha uma apedra”
ali, no centro do meu caminho,
e um cangambá nojento
sempre a me olhar.

Por que deus e o DIABO
que nunca foram meus amigos,
permitiram que um cangambá nojento,
uma pedra grande e mais um cacto repelente
ficassem ali plantados
no centro do meu caminho?...

Toca Filosófica, 23/9/2002

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