sábado, 15 de março de 2008

O GAVIÃO DE PENACHO, COM SEU OLHAR AGUDO, ESPIA O MEU CORPO ESQUÁLIDO, ANTES DE DESCER À SEPULTURA

(Para um certo pregador dono da verdade)

Meu corpo:
substância vital
herdada dos meus pais,
Cosme Theodoro & Don”Ana Francisca da Silva.
Misto de cálcio, ferro, cartilagem e sangue.

Meu corpo:
um amálgama
de esperma, merda, deus e o DIABO.
Contendo ternuras e maldades
inerentes à raça humana.

Meu corpo:
que ele se foda.
Vá pros quintos dos Infernos,
pro céu ou para onde quer que seja -
isso no seu devido momento.
Vire adubo para alimentar plantinhas humildes
de beira de cemitério de periferia
ou seja incinerado em forno de l. 400 graus centígrados -
(afinal, depois da morte, acabam-se todas as vaidades).
“Vaidade das vaidades” - já dizia meu compadre São Salomão.

Meu corpo:
essa bela mierda,
que segundo alguns religiosos,
foi projetado lá na aurora dos tempos
por um deus malicioso,
ao ver uma vaca amarela mijando.

Então que seja este corpo
(após a minha morte, é claro!..)
comido por ratazanas, por gaviões de penacho
ou qualquer outro carniceiro feroz,
que dele venha a se apetecer.
As raposas, por exemplo, as hienas, os tubarões...
E daí?... Estarei morto e bem morto.
Então, que diferença faz ser roído por vermes
ou por outro predador faminto?...

Termino este poema (poema?...) propositalmente
com uma tremenda digressão
e um conselho ao poeta Edson Bueno de Camargo (o gordo)
e suas metáforas medonhas:
amigo, volta ao chão, deixa as estrelas
(lá por certo estará o Bilac, ocupando o seu lugar)
e faz poemas do corpo e com o corpo,
como quer o Mestre Trevisan.
Com palavras de cristão -
explorando seus cheiros (de corpo, é claro), seus pruridos),
de uma maneira que todos te entendam.
Deixa o portuga Hélder, deixa o Willer, deixa o Roberto Piva de lado rapaz!...
E sê tu mesmo. A exemplo de Natanael,
personagem de “Os Frutos da Terra”,
famoso romance de André Gide.

Toca Filosófica, 8/5/2007

Um comentário:

Edson Bueno de Camargo disse...

Carta resposta ao poeta Aristides Theodoro sobre insinuações à minha falta de originalidade.



Do menor para o maior, isto é vida Abridor, mas do maior para o menor, Abridor: isto é morte.
Palavras de Incerto para Tim Hunter (personagem de quadrinhos baseado nas novelas de Diana Wynne Jones) em Os Livros de Magia – Neil Gaiman


Tudo flui e nada permanece; tudo se afasta e nada fica parado.... Você não consegue se banhar duas vezes no mesmo rio, pois outras águas e ainda outras sempre vão fluindo.... É na mudança que as coisas acham repouso....
Heráclito, fragmentos


caro amigo não me peça
para voltar para um atrás que não existe
cada dia que se passa o mundo se transforma
como Cortez antes de cobrir o México de sangue
queimei meus navios na praia para não poder voltar
a cada giro da Terra, esse não acontece no mesmo lugar
o cio dos ventos urdem as chuvas
que destruirão sempre o velho em novo dilúvio universal

o jovem Natanael era uma espécie de Sidarta
em busca de verdades absolutas
eu não
há muito já não procuro por profetas e profecias
quebrei as estátuas dos mestres e deuses ímpios que cercavam a minha Caaba
referências são necessários alicerces obscuros
que devem permanecer enterrados sob a terra
embora em momentos oportunos serão lembrados
tenho todas as respostas do mundo e nenhuma pergunta
os frutos da terra estão à minha mesa
posso pegá-los e tocá-los no momento em que quiser
a simplicidade é tão enganosa quanto a complexidade
são nossos atos e não palavras que criarão a redenção do mundo

o cheiro das coisas está em meus poemas
assim como meus poemas se diluem no cheiro das coisas
como apanham as cores do homem, da terra e da água
e as transformam em palavras
nem sempre audíveis ou facilmente compreensíveis
minhas metáforas medonhas só põem medo a quem não quer compreendê-las




não vou cantar minha pátria ou qualquer outra pátria
estas artificialidades geopolíticas que agrupam gentes sem afinidade
onde todos são esmagados pelo peso do estado
pelas peças do ouro
pela falta de pão
“fronteiras são as linhas de nossas mãos”
arame farpado para o gáudio dos poderosos
que só lembram de seus filhos amados
quando precisam de sangue jovem para homenagear Ares

não me peça para ser cristão
a humildade não cabe em meus trajes de Narciso
serei um rei mesmo em trapos apodrecidos
Caboclo das Sete Encruzilhadas irrompendo em mesa branca
lorde templário
visionário louco no sertão
mesmo que o velho deus barbudo me cubra de hóstias de sangue
não dobrarei os joelhos a nenhum deus
que não seja eu mesmo
“ Bem aventurado aquele que açoita seu deus”
já dizia Nietzche em seus bigodes de asa de andorinha


por fim
posso afirmar que declino de seus conselhos
embora agradecido de sua preocupação
não emulo meus professores
o processo de criação é um mistério e morre em seu ato
o que sai de minha pena é aquilo que me acode e me convêm
a poesia é tão rica para se manter em uma única forma
o mundo da palavra tão vasto para ser limitado
se quisesse ser simplesmente agradável ao mundo
seria como certos escritores e poetas laudatórios
sempre eivados de inveja e despeito
agradecendo às autoridades o ar que nos permitem respirar

só sei escrever em liberdade
mesmo que pague um preço por isso
ou signifique algum tipo de exílio ao esquecimento
é meu fel e minha delícia
meu coração adquiriu o peso de uma pluma para a balança de Osíris
e tenho todo o tempo da existência para perder e beber com meus amigos